segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Nem Três, Nem Reis! A verdadeira História dos Magos



Figuras notórias nos cartões natalinos, os três reis magos exercem
fascínio sobre os cristãos do mundo inteiro. Mas quem disse que eram
“reis”? E mais: quem disse que eram “três”? Não há uma única passagem
bíblica que afirme isso. Presume-se que eram três por serem três os
presentes que trouxeram ao menino Jesus. Mas não há qualquer indício
para que presumamos que eram reis.

Até nomes e nacionalidades já lhes foram atribuídos: Baltazar, o
árabe; Belchior, o indiano; e Gaspar, o etíope. Geralmente, eles
aparecem nos quadros natalinos ao redor da manjedoura, porém a Bíblia
sugere que ao chegarem a Belém, Jesus já teria por volta de dois anos.

Se quisermos distinguir entre o que diz a tradição e o que dizem as
Escrituras, nada melhor do que examinarmos o texto bíblico em busca de
mais informações sobre esses personagens misteriosos, aproveitando
para buscar edificação para nossas vidas. Afinal, nada do que está
registrado na Bíblia tem outro propósito que não seja nos edificar.

“Tendo Jesus nascido em Belém da Judéia, no tempo do rei Herodes,
vieram uns magos do Oriente à Jerusalém, e perguntavam: Onde está
aquele que é nascido rei dos judeus? Vimos a sua estrela no Oriente, e
viemos adorá-lo” (Mt.2:1-2).

Quem seriam os magos? Por que foram chamados assim? Pode-se
conjecturar a partir de evidências extra-bíblicas. A palavra “magoi”,
traduzida como “magos” sugere que eles pertenciam à casta sagrada dos
Medos, sendo sacerdotes da Pérsia. A religião praticada por eles
provavelmente era o Zoroastrismo, que proibia a feitiçaria; seu
encontro com Jesus se deveu à sua astrologia e habilidade de
interpretar sonhos.

Naquela época não havia distinção entre astronomia e astrologia. Todos
os que se ocupavam a estudar os fenômenos celestes eram astrólogos.
Portanto, a astrologia era considerada uma ciência. A aparição de um
novo astro nos céus indicava que algo extraordinário estava por
acontecer.

Acerca da misteriosa estrela, há várias explicações plausíveis.

# A palavra “aster” pode significar um cometa.

# A estrela poderia ter sido a conjunção de Júpiter e Saturno (7
a.C.), ou de Júpiter e Venus (6 a.C.). Conjunção é quando dois astros
parecem se fundir nos céus devido a um alinhamento raro, e assim, dão
a impressão de serem um único astro, mais brilhante que todos à sua
volta.

# Os Magos podem ter avistado uma super-nova, uma estrela que aumenta
de repente em tamanho e brilho e em seguida, diminui novamente.
Fenômeno muito raro de ser avistado à olho nu.

Estas teorias, embora razoáveis, deixam de lado a explicação que “a
estrela que tinham visto no Oriente, ia adiante deles até que,
chegando, se deteve sobre o lugar onde estava o menino”(Mt. 2:9). Que
fenômeno celeste seria capaz de tal proeza?

Teria sido a Estrela de Belém um milagre, tal qual a coluna de fogo
que permaneceu no arraial durante o Êxodo dos hebreus (Êx.13:21)? Ou
como o resplendor de Deus que brilhou em torno dos pastores no campo
(Lc.2:9), ou ainda como a luz proveniente do céu que apareceu a Saulo
de Tarsos no caminho de Damasco (At.9:3)?

Tenha sido um fenômeno natural ou sobrenatural, o que importa que os
magos se deixaram guiar por ele, e isso os levou até Jerusalém.
Provavelmente, eles imaginaram que o novo rei teria nascido em
Jerusalém. Que outro lugar haveria para que um monarca judeu nascesse
do que na cidade dos reis?

Eles também achavam que todos estavam a par da boa notícia. Mas se
equivocaram. Ninguém na cidade sabia que algo extraordinário havia
acontecido. “Quando o rei Herodes ouviu isto, alarmou-se e com ele
toda Jerusalém” (Mt.2:3). A voz dos magos ecoou pelas ruas e mercados
da cidade santa. Mas em vez de alegrar-se com a notícia, todos se
alarmaram.

Logo agora que todos já haviam se acostumado à idéia de terem Herodes,
um edomita, como rei, a aparição de um novo rei subverteria a ordem, o
Status Quo. E vale dizer que conquistar a simpatia dos judeus custou
muito caro a Herodes. Entre os empreendimentos que visava conquistar a
admiração dos judeus, estava a restauração do templo, tornando-o ainda
mais suntuoso do que nos tempos áureos.

Herodes, agora, se sentia ameaçado. Ele sabia que não tinha o direito
de sentar-se naquele trono. Ele não pertencia à linhagem de Davi.
Sequer era judeu. Por isso, convocou “todos os principais sacerdotes,
e os escribas do povo”, e “perguntou-lhes onde havia de nascer o
Cristo”(v.4).

Os magos não possuíam todas as informações. Eles sabiam que o menino
havia nascido, mas não tinham idéia de “onde”. Nada indica que eles
conhecessem os textos sagrados, as profecias. O único livro de que
dispunha para obter informações sobre o nascimento do Messias era o
“livro da natureza”. A astrologia era a sua ciência.

Há que se ponderar aqui sobre algo: a ciência não responde a todas as
nossas perguntas. Através da ciência podemos fazer uma leitura dos
fenômenos naturais que nos forneceram indícios acerca de Deus. Há que
se deduzir: se há leis que regem o Universo, logo, há por trás delas
um Legislador.

Não há razão para que a fé e a ciência se ponham em trincheiras
opostas. Cada uma se dispõe a responder a perguntas diferentes, que
abarcam sua área de atuação.

Em se tratando da criação, por exemplo, podemos dizer que a ciência se
propõe a responder a duas perguntas: “quando”, e “como”. Já a fé deve
focalizar em outras questões: “quem”, e “pra quê”.

No caso que estamos examinando, a ciência levou os magos na direção
certa, porém, faltava-lhes algumas informações que só a revelação
contida na Palavra é capaz de suprir.

Herodes mandou chamar a “nata” da teologia de sua época. Ninguém
conhecia tão bem as escrituras do que os sacerdotes e os escribas. Os
primeiros, porque a liam constantemente. E os escribas porque a
copiavam exaustivamente.

“Eles lhe responderam: Em Belém da Judéia, pois foi isto que o profeta
escreveu: E tu, Belém, terra de Judá, de modo nenhum és o menor entre
os governantes de Judá; pois de ti sairá um guia que apascentará o meu
povo, Israel” (Mt.2:6).

Embora buscasse na fonte certa a resposta, a motivação de Herodes era
a pior possível. Como ele, há muitos em nossos dias que usam das
Escrituras para alcançar objetivos espúrios, assim como há muitos
cientistas, alguns deles ateístas, que buscam respostas com a melhor
das intenções.

O texto prossegue, dizendo que “Herodes chamou em secreto os magos,
inquiriu deles exatamente acerca do tempo em que a estrela aparecera”
(v.7).

Por que Herodes não buscou tal informação nas Escrituras?
Simplesmente, porque elas não ao contém. Assim também, é perda de
tempo buscar certas informações nas páginas das Escrituras.
A Bíblia jamais se preocupou em oferecer um cronograma exato de
acontecimentos históricos. Dizer que a criação se deu há cerca de seis
mil anos, por exemplo, é fazer uma leitura ingênua e equivocada do
livro sagrado.

Depois de certificar-se do tempo em que a estrela aparecera, Herodes
enviou-os a Belém, dizendo-lhes: “Ide e perguntai diligentemente pelo
menino. Quando o achardes, avisai-me, para que eu também vá e o adore”
(v.8).

Os meios usados por Herodes para obter informação sobre o nascimento
do Messias eram legítimos e louváveis, porém suas motivações e seu
objetivo eram deploráveis. Aqui encontramos o inverso do que foi
proposto por Maquiavel: os meios justificando os fins!

“Tendo eles ouvido o rei, partiram. E a estrela, que tinham visto no
Oriente, ia adiante deles até que, chegando, se deteve sobre o lugar
onde estava o menino. Vendo eles a estrela, alegraram-se imensamente”
(vv.9-10).

Por que, antes de chegarem a Belém, eles passaram por Jerusalém?
Porque a estrela os guiara até lá. Porém, ela não se estagnou. Era
apenas uma escala na viagem, não o destino final. A estrela só parou
sobre o lugar onde estava o menino.

Imagine a alegria daqueles homens, depois de viajarem por cerca de
1200 milhas, empregando para isso cerca de doze meses de camelo em um
trajeto por regiões inóspitas e desérticas do oriente médio.

Para a surpresa deles, o Messias anunciado pela estrela não fora
encontrado nos palácios de Jerusalém, mas em uma modesta casa em
Belém.

“Entrando na casa, viram o menino com Maria, sua mãe e, prostrando-se,
o adoraram. Então, abrindo os seus tesouros, lhe apresentaram suas
dádivas: ouro, incenso e mirra” (v.11).

De alguma maneira, eles chegaram à conclusão de que aquele menino não
era apenas mais um monarca, mas o próprio Deus que Se fizera homem.
Por isso, sentiram-se compungidos a se prostrar e adorá-Lo.


Chegara a hora de descarregar seus camelos. Em vez de fraldas,
mamadeiras, chupetas, e outras coisas que geralmente se dá um nenê,
eles presentearam ouro, incenso e mirra.

O incenso era considerado oferenda sagrada. Todas as religiões do
Oriente o usam em seus rituais, inclusive o budismo. Ao presenteá-Lo
com incenso, estavam reconhecendo Sua divindade.

A mirra era o perfume usado para embalsamar os mortos. Cada família
deveria ter em casa mirra suficiente para um eventual falecimento de
um ente. Portanto, quem Lhe presenteou com a mirra, estava
profetizando a Sua morte em favor da humanidade. Ali estava alguém que
nascera para morrer. Entretanto, aquela mirra jamais fora usada em
Jesus. Quando Maria foi ao Seu túmulo para embalsamá-lo, Ele já havia
ressuscitado. Além do mais, dias antes de morrer, outra Maria, irmã de
Lázaro, se antecipou a derramar um perfume caríssimo sobre Jesus,
preparando-o para o sepultamento, conforme Ele mesmo testificou. A
propósito, aquele perfume era destinado a Lázaro, porém não foi usado
nele, para ser usado em Jesus. Por isso, Lázaro cheirava mal depois de
quatro dias de sepultamento. Não era comum que isso acontecesse a um
judeu. Quanto à mirra com que fora presenteado pelos magos,
provavelmente tenha sido usado em algum outro familiar de Jesus. De
qualquer maneira, profetizava Sua morte.

E quanto ao ouro? Para saber a necessidade de se presentear o Messias
com o mais precioso metal, precisamos avançar no texto:

“E, tendo sido por divina revelação avisados em sonhos para que não
voltassem a Herodes, regressaram por outro caminho à sua terra. Tendo
eles partido, o anjo do Senhor apareceu a José em sonhos, e disse:
Levanta-te, toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito. Fica-te lá
até que eu te avise, pois Herodes há de procurar o menino para o
matar. Levantando-se ele, tomou de noite o menino e sua mãe, e foi
para o Egito. Ali ficou até à morte de Herodes, para que se cumprisse
o que foi dito da parte do Senhor pelo profeta: Do Egito chamei o meu
Filho. Então Herodes, vendo-se iludido pelos magos, irritou-se muito e
mandou matar a todos os meninos de Belém, e de todos os seus
arredores, de dois anos para baixo, segundo o tempo em que
diligentemente inquirira dos magos” (vv.12-16).

José era carpinteiro, e provavelmente tinha uma clientela em sua
cidade. Deixá-la repentinamente para ir para um país estranho
provavelmente seria dispendioso. Até que ele se firmasse
profissionalmente no Egito, como ele poderia prover o sustento de sua
família? Foi por isso, que Deus proveu todo aquele ouro através das
mãos generosas dos magos.

Nosso Deus é um Deus de provisão e não de improvisos. Ele conhece o
coração dos homens, e sabe o que nos espera lá na frente. Antes que
nos aconteça qualquer coisa, Ele sempre nos envia os proventos
necessários.

Talvez José jamais tenha entendido o motivo do incenso e até da mirra,
uma vez que jamais precisou ser usada em Jesus. Mas ele entendeu
perfeitamente a razão pela qual Deus lhes enviara todo aquele ouro.

Mas se os magos houvessem descarregado seus camelos no palácio de
Herodes? E aqui devemos ponderar: onde temos descarregado nossos
camelos? Em que temos investido nossos haveres? Que tal como Deus usou
os magos, sejamos usados por Ele para suprir as necessidades de Sua
obra, em vez de investir em projetos megalomaníacos de quem usa as
Escrituras em nome de uma agenda secreta e de motivações nem sempre
louváveis.


| Autor: Hermes C. Fernande Divulgação: estudosgospel.Com.BR |

Relativismo - Igreja Presbiteriana de Pinheiros - Paulo Junior

Águas passadas não movem moinhos?




Esse dito popular é sempre usado em resposta a algo que exige comprovação ou recordação do passado. É a mesma coisa que dizer “quem vive do passado é museu”. Será? O passado nos serve de aprendizado, para que tenhamos o mesmo ímpeto de alguém ou para que não façamos algo que nós ou alguém já fez. 

E é justamente isso o que o autor de Hebreus no capitulo 10.32-39 vai fazer para incentivar os crentes a perseverarem na fé. 

Um passado como exemplo – 32.34

O autor de Hebreus lembra aos seus leitores de quando eles foram iluminados. Provavelmente estes eram judeus convertidos, passaram por perseguições por causa da fé em Cristo, como o texto mostra, eles foram por causa de Cristo expostos como em espetáculos, em opróbio (extrema humilhação publica), tribulações (v.33). E, no inicio desta fé, eles entenderam qual era o chamado de Cristo, provavelmente o primeiro amor. Pois, passando por tais aflições sentiram alegria em perder seus bens, sabendo que o tesouro que estás no céu é incorruptível (Mt 5.10-11), ou como diz o texto, superior e durável (v. 34). 

E essa recordação da sua fé, esperança e amor em dias passados se torna a base para o seguinte apelo: Não abandoneis, portanto, a vossa confiança; ela tem grande galardão” (v. 35). 

Um presente perseverante – 36-39 

É bem sabido que a obra da salvação não depende da ação humana, pois é uma obra totalmente de Deus. Mas, enquanto a salvação final na consumação for uma promessa, temos a necessidade de perseverança na fé, a fim de fazermos a vontade de Deus e recebermos a promessa de Deus. E qual promessa é essa? 

Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” - João 3.16

A promessa que nós temos é a vida eterna. A nossa vida não se finda aqui, ela continuará em louvor a Deus no outro lado, na eternidade. E além da promessa que receberemos, outra razão para perseverarmos é o fato de que Cristo virá: 

Porque ainda um pouquinho de tempo, E o que há de vir virá, e não tardará. Mas o justo viverá pela fé; E, se ele recuar, a minha alma não tem prazer nele” (vs. 37,38). 

A vinda de Cristo é o ápice da consumação de todas as coisas, pois todo o mal que passamos aqui, tanto físico como moral terá um fim, porque Cristo destruirá Satanás com o sopro de sua boca (2Ts 2.8) e vingará o sangue daqueles que estão debaixo do trono de Deus (Ap 6.10). 

E assim, aquele que vive pela fé, vive porque sabe do que acontecerá no fim e da promessa que nos está guardada. Mas aquele que retrocede Deus não tem prazer. E nós não somos dos que retrocedem, somos, entretanto, da fé para a conservação da alma (v.39). 

O que devemos fazer?

Devemos lembrar da obra que Cristo fez na cruz em favor de nós, nos transportando das trevas para a sua maravilhosa luz. O qual, também, fez cair as escamas de nossos olhos, revelando a impiedade em que nós vivíamos e nos livrando do juízo eterno. 

Como devemos fazer?

Assim como no passado, no inicio de nossa fé, no fervor de tudo, suportávamos os afrontamentos e confiávamos em Cristo mediante as dificuldades, também no presente devemos confiar mais em Deus. Pois, quanto mais conhecemos a Cristo sabemos quem é Deus, e se sabemos quem é Deus mais nós confiamos em Deus como nosso auxilio bem presente no dia da angústia. 

Mas, aqueles que retrocedem Deus não tem prazer neles, pois estão negando a Cristo e expondo-o ao desprezo, querendo crucificar de novo o filho de Deus.

***
Fonte: Bereianos

Apologética da gentileza




Antes, santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração, estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós, fazendo-o, todavia, com mansidão e temor, com boa consciência” (1Pedro 3.15-16a).

Quando paramos para pensar em apologética, a imagem que mais se assimila é a de alguém beligerante que discorda de todos. Porém, a palavra “apologética” na tradição cristã tem origem jurídica. Os primeiros apologetas do cristianismo não ficariam o dia inteiro no Facebook respondendo a perguntas que as pessoas fazem sobre teologia. Eles iriam para o contexto de uma defesa jurídica porque, se fizessem uma boa defesa de que o cristianismo é razoável, que não é uma religião ateísta – como eram acusados os cristãos –, que não praticavam canibalismo – isto por conta da ceia – evitariam a morte. Esses apologetas, portanto, entram no cenário porque estão diante de alguns cristãos que serão lançados aos leões e a defesa que farão pode salvá-los.

A apologética, no início, tem o tom de mostrar a relevância do evangelho, mas com a finalidade de defendê-lo, pois a defesa dele garantiria a prática cristã, a vida baseada no evangelho. O contexto de uma vida baseada no evangelho, na ocasião, era uma vida marginalizada. A ideia era defender o evangelho para mostrar que os cristãos não eram nocivos à sociedade, que não deveriam ser tratados como estavam sendo tratados.

Curvar-se diante de Cristo não significava que eles não obedeciam às leis. Eles queriam ter o direito de dizer que somente Cristo era o Senhor, mas isso não significava que César não tinha que ser respeitado. Ao não se curvarem diante do imperador, não significava que não respeitavam César com toda autoridade que lhe era concedida.

A tarefa do apologista, então, era a de um advogado, de fornecer as peças de um argumento para mostrar que aquele que está sendo acusado é inocente.

Do que estamos sendo acusados hoje? Do que a igreja está sendo acusada? Diante de uma acusação, nossa primeira reação pode ser a reação de simplesmente responder com a mesma medida, de odiar aqueles que nos odeiam, de responder com perseguição, com aspereza.

Pedro, ao escrever essas palavras, escreve-as para forasteiros, para pessoas que estão no contexto que não é o habitat natural delas. É um mundo diferente. Diante disso, eles ainda vivem debaixo do evangelho. O evangelho exige que eles, por natureza, adotem padrões que a cultura rejeita. Pedro sabe que aquela comunidade está sofrendo.

Ao defendermos o evangelho, não precisamos falar grosso ou gritar para que ele mexa com as estruturas de alguém. Mesmo que falemos com toda gentileza, o evangelho tem garras. Ele vai mexer com a estrutura de toda e qualquer cultura. Pedro sabe que não conseguiremos evitar o confronto do mundo. Os primeiros defensores enfrentavam essa oposição. Lutero dizia que sempre que o evangelho fosse pregado geraria conflito. Nesse contexto é que apresentaremos o evangelho. Irão nos perguntar a razão da esperança que há em nós e o desafio de Pedro é que estejamos preparados para isso.

Para que possamos responder, precisamos aprender a ouvir e a perguntar. O que as pessoas à nossa volta estão nos perguntando? As pessoas querem saber se somos inteligentes ou que, no fundo, quando entram num debate, querem saber o porquê você acredita naquilo que você diz ser o evangelho? Esta é a pergunta mais importante que o apologeta deve responder. Quando perguntamos por que acreditamos no evangelho, fazemos um exercício de reflexão, para saber o porquê acreditamos. Refletimos na razão de nossas atitudes, e no por que cremos naquilo que cremos.

Pedro usa palavras que tentam despertar em cada um a resposta da esperança que há em nós. Para isso, temos que fazer uma reflexão sobre aquilo que cremos. Vivemos num contexto onde aquilo que chamamos de evangelho está diluído, é superficial. As pessoas não sabem o que significa o evangelho. Eu acho que esperamos que o evangelho seja algo simples, mas confundimos algo simples com algo simplista, de tal forma que não queremos mais mastigar o evangelho, queremos que alguém o mastigue por nós. Não queremos pensar. O evangelho só vai transformar você se você mastigá-lo. Se você não entendeu o evangelho e não tem convicção dele, não há como você defendê-lo. Como você defende algo do qual não acredita? Se você não acreditar naquilo que está pregando, terá que defender a técnica do cinismo, como vendedores que não acreditam na qualidade do produto. Não dá pra fazer isso com o evangelho. Ou acreditamos no evangelho ou não conseguiremos defendê-lo. O evangelho deve ter o padrão que toca o seu coração e faz você admirá-lo. Para sustentar o evangelho, precisamos admirá-lo e, para admirá-lo, precisamos nos aprofundar nele.

Lewis e o cristianismo “água-com-açúcar”

Quero apresentar um apologeta da gentileza por excelência. C. S. Lewis.

Em seu livro “Cristianismo Puro e Simples”, Lewis explica porque o ateísmo é simplista. Mas ele diz que há também o cristianismo simplista, que é o cristianismo água-com-açúcar, aquele cristianismo de respostas prontas, que não nos faz pensar. Ele diz:

“Pois bem, então o ateísmo é simplista. E vou lhes falar de outro ponto de vista igualmente simplista que chamo de ‘cristianismo água-com-açúcar’. De acordo com ele, existe um bom Deus no Céu e tudo o mais vai muito bem, obrigado – o que deixa completamente de lado as doutrinas difíceis e terríveis a respeito do pecado, do inferno, do diabo e da redenção. Os dois pontos de vista são filosofias pueris.”

Ele compara esse tipo de cristianismo com o ateísmo porque é o tipo de cristianismo que tenta tirar do evangelho a força de desestabilização de estrutura de nós mesmos. É o tipo de cristianismo que, quando você estiver passando por dificuldades, lhe dirá coisas do tipo: “Menino vai orar, você está em pecado”.

Não conseguimos aprofundar uma questão, queremos respostas simplistas. Não queremos pensar na profundidade. Ser simples é uma coisa, ser simplista é outra. O evangelho é simples como a luz, mas isso não significa que seja fácil de entender. A luz é entendida tanto como uma onda como uma partícula e nenhum dos dois entendimentos está errado. É algo que não se resolve, é complexo. Você quer que Deus seja assim simples? Você acredita que, por causa dessa simplicidade de Deus, você está diante de algo simplista? A riqueza de Deus está no fato de Ele ser simples, mas isso demanda profundidade. O evangelho exige profundidade de mim e de você. Vivemos num contexto hoje onde as pessoas pagam dobrado para fazer coisas em vez de pensar. Por isso passamos tanto tempo no videogame. É legal, mas não dá em nada. Você sai de uma partida depois de várias horas e deve se perguntar: “Legal, e aí? Puxa, quanta coisa poderia ter feito nesse tempo!”

Por que passamos horas em frente ao videogame ou no shopping? Sabe por quê? Porque pensar dói. Porque pensar exige um movimento doloroso.

A alegoria da caverna de Platão

Todos nós conhecemos a alegoria da caverna. O que Platão dizia que aconteceria se aqueles prisioneiros fossem libertos de suas correntes e vissem a luz, se vissem o sol brilhando? O que aconteceria se vissem que o mundo deles não se resume àquela “caixinha”, mas que existe um mundo superior e que aquilo são apenas sombras? Eles sofreriam. Ficariam cegos por causa da luz, sentiriam dor porque não estão acostumados a fazerem isso.

Similarmente, você somente irá se sentir à vontade quando começar a estudar o evangelho. No início, terá sono. Só quando começarmos a praticar é que não irá doer. Isso exige de nossa parte um movimento que dói. Temos que ler o texto bíblico várias vezes. Dói. Com o passar do tempo, porém, esse movimento se torna comum e deixa de doer, você se acostuma.

Quando o prisioneiro fica cego, isto é o símbolo da ignorância. Quando alguém se converte e se depara com o evangelho, fica cego, ignorante. Isto acontece, por exemplo, com pessoas que vão à igreja pela primeira vez. Não sabem o que fazer. A constatação da ignorância não é algo gostoso. Temos dificuldade de reconhecer nossa ignorância.

Como podemos resumir o evangelho em três minutos? Isso diz muito sobre se compreendemos ou não o evangelho. No momento de olharmos para a luz, podemos ficar cegos. Mas a cegueira passa com o tempo.

O texto da caverna é a alegoria de que todos estão presos. Platonismo e cristianismo se parecem bastante, mas possuem muitos contrapontos. No caso da caverna, é o homem que se liberta. Basta que ele reflita sobre a realidade à sua volta. Em contrapartida, no cristianismo, nós é que somos libertos pelo Espírito Santo. Somente Ele liberta nosso coração para enxergarmos o evangelho.

Para pregarmos o evangelho, para que possamos defendê-lo e o anunciarmos, temos que nos aprofundar. As pessoas se aproximarão não por causa de argumentos, mas por causa de nosso testemunho. Somente pelo Espírito Santo seremos libertos. Não adianta explicarmos através da lógica que o evangelho é a verdade se não aceitarmos a Bíblia na cabeça. A obra é do Espírito Santo.

Quando alguém enxerga a realidade, porém, ele volta para a caverna para tentar libertar os demais. Fazemos a mesma coisa quando conhecemos o evangelho. Nasce em nós o desejo de ir à caverna para proclamá-lo. Isso, no entanto, só irá acontecer quando admirarmos o evangelho. Antes de desenvolvermos qualquer argumento, o que você e eu precisamos é da experiência do evangelho. Ele não é um folheto evangelístico, é o fundamento da igreja. Também não é apenas uma mensagem para ganhar pessoas para Cristo, é o fundamento da igreja. Enquanto não nos aprofundarmos nesse evangelho e fizermos dele nossa reflexão diária e o tema de nossa vida, não conseguiremos falar da Palavra de Deus ao mundo.

O que é o evangelho?

Gostaria de encerrar pensando no evangelho.

O que é o evangelho? Imagine um artista que está focado em sua obra e nada desvia sua atenção dela. Ele é perito na obra. Ele é o ser criador. Ele não falha. É da natureza do barro estragar, mas é da natureza do oleiro criar. Embora o barro esteja estragado, o oleiro não o joga fora, ele pega o mesmo barro e cria novamente. Isso é redenção.

Deus criou o mundo de uma maneira perfeita e maravilhosa e estragamos tudo. Mas não é o fim. A natureza do Criador também é a natureza do redentor. Temos a natureza da destruição, mas Ele tem a natureza da redenção. Eu e você podemos estragar histórias lindas que Deus está criando, mas não temos o poder de estragar a história eterna que Deus prepara para nós. Não podemos destruir Deus. Enquanto Deus existe, há redenção dos estragos.

Não é bonito o evangelho, a história de Deus? Ele cria tudo de maneira perfeita porque Ele é perito. Ele não desiste. Esta é a história do evangelho. Você não pode fazer um estrago tão grande para o qual não haja redenção. Para defender o evangelho, temos que amá-lo, admirá-lo. Como está nossa admiração pelo evangelho pela obra de redenção? O peso de nossa admiração representa o peso de nosso amor às respostas que são feitas ao nosso tempo. Não só apresentando e defendendo o evangelho de uma maneira lógica, mas, sobretudo, fazendo com carinho e gentileza, que só os seres dóceis podem ter diante dos seres brutos. Que o evangelho seja dito de uma forma dócil, mas não de uma forma domesticada, ou seja, uma forma que não desestabilize. Não espere que a pregação do evangelho não mexa com as estruturas das pessoas. Não temos que ficar de chateados quando alguém nos ofende. Isso irá acontecer sempre quando pregarmos o evangelho. O que não pode faltar em mim e em você é o amor. Amor por Deus e por pessoas, ou seja, que não iremos humilhá-las. Não temos que mostrar que somos inteligentes. Estamos aqui para pregarmos o evangelho e mostrar o que ele tem feito conosco.
***
Fonte: Este artigo é um sermão pregado pelo pastor Jonas Madureira no dia 24/05/14 no culto “Inter Jovens” realizado na Igreja Batista Maranata em São José dos Campos, SP. Não se trata de uma transcrição integral do sermão, embora grande parte dele tenha sido transcrita. Alguns trechos foram adaptados para a linguagem formal e a essência da mensagem não foi alterada.

Via: Tuporém

Um esclarecimento sobre os jogadores que oram a "Oração do Pai Nosso"





É muito comum vermos os jogadores orando em campo diante de uma decisão, quando vão entrar no lugar de outro jogador e/ou quando vai começar o jogo, eles fazem uma roda, falam algumas palavras de incentivo e oram a "Oração do Pai nosso".

O problema em si não é o fato de que cada um exerça a sua fé - bom, sabemos que a fé verdadeira deve ser, totalmente, voltada para Deus em Cristo Jesus - mas por eles orarem a "Oração do Pai nosso" e, por conseguinte, os evangélicos que estão assistindo se alegrarem com isso.

Então, aqui vão algumas considerações sobre a "Oração do Pai nosso"; não é um estudo "sistemático" sobre esta oração, mas uma parte dela, na qual ninguém presta atenção.

A "Oração do Pai nosso" começa justamente com a frase, "Pai nosso...". Por que "Pai nosso"?

A oração se inicia com o sentido de confiança e humildade. Confiança por chamar Deus de Pai, não só como criador, mas como providenciador de nossas necessidades. Mas, acima de tudo, quando O chamamos de Pai, é pelo respeito que devemos ter por Ele. E assim, a nossa humildade de reconhecermos que necessitamos diariamente de um único Pai.

Mas quando O chamamos de Pai, devemos entender esse "Pai" por que Ele é o criador de toda a humanidade, pois a Bíblia chama alguns de filhos por causa da morte expiatória de Cristo, onde que, por esses que Cristo morreu, serão: Eleitos, Chamados, Regenerados, Convertidos, Justificados, Adotados, Santificados, Perseverantes e Glorificados.

Nem todo o mundo pode chamar Deus de "Pai".


• A Bíblia é clara em mostrar que os que são Seus filhos são nascidos de Deus: "Os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus." João 1.13.
• Estes que são nascidos de Deus, também foram predestinados para serem adotados: "E nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade," Efésios 1.3.
• E todos aqueles que são nascidos de Deus, predestinados para serem adotados por Cristo Jesus e recebem o Espirito Santo, podem clamar "Aba, Pai", porque recebemos o Espirito de Adoção (Rm 8.15; cf. Gl 4.6).

Calvino, diz:

A primeira regra em toda oração consiste em apresentar-se a Deus em nome de Cristo, pois neste nome ninguém pode ser-lhe desagradável.
Ao chamar a Deus de Pai nosso, já pressupomos o nome de Cristo.
Mais ninguém no mundo é digno de apresentar-se a Deus e de aparecer perante seu rosto. Este bom Pai celestial, para livrar-nos de uma confusão que inevitavelmente nos turbaria, nos deu como mediador e intercessor a seu Filho Jesus. Detrás dos passos de Jesus podemos aproximar-nos a Ele confiadamente, tendo plena certeza de que não será rejeitado nada do que peçamos em nome deste Intercessor, pois o Pai não pode negá-lhe nada.[1]

Então, podemos concluir, de que se alguém não se encaixa da ordem descrita acima e nem Cristo é o centro de sua vida, logo, não deve chamar Deus de Pai. Porque somente por Cristo, como o centro de nossas vidas, podemos nos achegar a Deus e chama-LO de "Pai".

PG - Quem sou eu?

Antinomianismo - sem lei!




Há um antigo verso que serve para ilustrar bem o tema antinomiano. O verso diz: "Livre da lei, que maravilhosa condição, posso pecar quanto quiser e ainda alcançar a remissão".

Antinomianismo significa literalmente "antilei". Ele nega ou diminui a importância da lei de Deus na vida do crente. É o oposto da heresia gêmea, o legalismo.

Os antinomianos cultivam aversão pela lei de várias maneiras. Alguns acreditam que não têm obrigação de obedecer às leis morais de Deus porque Jesus os libertou da lei. Insistem em que a graça não só liberta da maldição da lei de Deus, mas também nos liberta da obrigação de obedecê-la. A graça, pois, se torna uma licença para a desobediência.

O mais surpreendente é que as pessoas defendem este ponto de vista a despeito do ensino vigoroso de Paulo contra ele. Paulo, mais do que qualquer outro escritor do Novo Testamento, enfatizou as diferenças entre a lei e a graça. Ele se gloriava na Nova Aliança. Mesmo assim, foi muito explícito em sua condenação do antinomianismo. Em Romanos 3.31 ele escreve: "Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma, antes estabelecemos a lei.".

Martinho Lutero, ao defender a doutrina da justificação pela fé somente, foi acusado de antinomianismo. Ele, no entanto, afirmava com Thiago que "a fé sem obras é morta". Lutero discutiu com seu discípulo João Agrícola sobre esta questão. Agrícola negava que a Lei tivesse qualquer propósito na vida do crente. Negava até mesmo que a lei servisse para preparar o pecador para a graça. Lutero respondeu a Agrícola com sua obra Contra o Antinomianismo em 1539. Posteriormente, Agrícola se retratou de suas idéias antinomianas, mas a questão permaneceu.

Teólogos luteranos posteriores afirmaram a visão de Lutero da lei. Na Fórmula de Concórdia (1577), a última das declarações da fé luteranas, eles relacionaram três utilidades da lei: (1) revelar o pecador; (2) estabelecer um nível geral de decência na sociedade como um todo e (3) proporcionar uma regra da vida àqueles que foram regenerados pela fé em Cristo.

O erro primário do antinomianismo é confundir justificação com santificação. Somos justificados pela fé somente, independentemente das obras. Entretanto, todos os crentes crescem na fé ao observarem os mandamentos de Deus - não para granjearem o favor de Deus, mas movidos por uma amorosa gratidão pela graça que já lhes foi concedida através da obra de Cristo.

É um erro grave supor que o Antigo testamento era a aliança da lei e que o Novo Testamento é aliança da graça. O Antigo Testamento é um testemunho monumental da maravilhosa graça de Deus em favor de seu povo. Semelhantemente, o Novo Testamento está literalmente cheio de mandamentos. Não somos salvos pela lei, mas demonstramos nosso amor a Cristo obedecendo a seus mandamentos. "Se me amais, guardai os meus mandamentos." Jo 14.15.

Frequentemente ouvimos a afirmação: "O cristianismo não é um monte de normas sobre o que fazer e o que não fazer. Não é uma lista de regras". Há alguma verdade nesta dedução, visto que o cristianismo é muito mais do que uma mera lista de regras. Em sua essência, o cristianismo é um relacionamento pessoal com o próprio Cristo. Não obstante, o cristianismo também não é destituído de regras. O Novo Testamento claramente inclui alguns "faça e não faça". O cristianismo não é uma religião que sanciona a ideia de que todos têm o direito de fazer o que acharem melhor aos próprios olhos. Ao contrário, ele nunca dá a alguém o "direito" de fazer o que é errado,

Sumário:

1. Antinomianismo é heresia que diz que os cristãos não têm qualquer obrigação de obedecer às leis de Deus.
2. A lei revela o pecado, é o fundamento para a decência na sociedade e é um guia para a vida cristã.
3. O antinomianismo confunde justificação e santificação.
4. Lei e graça enchem tanto o Antigo quanto o Novo Testamento.
5. Embora obedecer à lei de Deus não seja a causa meritória da nossa justificação, espera-se que uma pessoa justificada busque ardentemente obedecer aos mandamentos de Deus.

Textos para meditação - Jo 14.15; Rm 3.27-31; Rm 6.1,2; 1 Jo 2.3-6; 1 Jo 5.1-3

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Fonte: O Calvinismo

Uma teoria teísta cristã da realidade


Por Cornelius Van Til


Vimos, anteriormente, que a primeira e principal pedra angular de uma verdadeira filosofia é uma teoria do conhecimento que esteja relacionada com a concepção de um Deus que conhece todas as coisas.

Devemos agora notar que a segunda pedra angular é, mais uma vez, a concepção de um Deus absolutamente autoconsciente. Imediatamente alguém levanta uma objeção e afirma que há, então, não duas, mas apenas uma pedra angular. Exatamente – as duas convergem em uma só. As duas são apenas uma. A razão para isso é que, em Deus, conhecimento e realidade são idênticos. Este ponto é fundamental, como veremos. Notemos que devido a essa identidade, uma verdadeira teoria do conhecimento implica numa verdadeira teoria da realidade e vice-versa.

Por outro lado, uma falsa teoria do conhecimento não é um brinquedo inocente, antes envolve uma falsa teoria da realidade e vice-versa. O ponto a partir do qual você inicia seu raciocínio faz pouquíssima diferença, contanto que você tome Deus em consideração desde o princípio. Um Deus absolutamente autoconsciente é a pressuposição de uma filosofia de vida verdadeiramente teísta. A razão pela qual devemos pressupor Deus é que não podemos tê-Lo de outra maneira. Apenas para se certificar: você pode ter um deus que não seja tomado como pressuposto, no entanto, ele não será mais do que um deus finito. A “espécie” de Deus que necessitamos deve ser pressuposta. Caso você seja demasiado “científico”, você não pode se dar ao luxo de começar com uma pressuposição. Contudo, eu não posso me dar ao luxo de estar desprovido de um Deus absoluto. Essas duas posições são semelhantes a dois homens, um dos quais preferem utilizar seu dinheiro para adquirir uma casa e o outro um carro? De modo nenhum – nós devemos raciocinar juntos até à morte. Eu continuarei mantendo que sua posição termina no inferno e a minha no céu. Ajo assim ousadamente porque o faço humildemente, como alguém que recebeu pela graça.

Deus

Na teologia, nós tratamos acerca dos atributos de Deus. Se tomarmos, agora, todos estes atributos juntos e direcioná-los para um único pensamento concentrado, nós podemos considerar tal pensamento como a pedra angular de nossa teoria da realidade. Esse pensamento, em si mesmo, não pode ser expresso em outra palavra a não ser Deus. Em nossa teoria da realidade, o elemento mais importante a ser mantido é que Deus tem a realidade de Si mesmo. Nós sempre ouvimos sobre a “realidade última”. Deus é nossa realidade última. Como tal, Ele deve ser eterno e, por sua vez, tudo que é temporal é derivado. Como realidade última, Ele deve ser completamente autoconsciente, e tudo aquilo que não é completamente autoconsciente é derivado. De semelhante modo, Ele deve ser autossuficiente; e tudo aquilo que não é autossuficiente é derivado.

O universo

O termo “universo” é frequentemente tomado como se incluísse Deus e o mundo. Nós o utilizamos como referência a toda a realidade não idêntica a Deus. O teísmo afirma que o universo é temporal. Assim, para um teísmo genuíno, o termo “dependência”, quando aplicado ao universo, não significa apenas “dependência lógica”. Antes, implica a temporalidade inerente do universo em distinção da eternidade de Deus. Roma talvez esteja satisfeita em dizer que, filosoficamente, nós não precisamos nem podemos manter algo além da “dependência lógica”; todavia, nós, como Protestantes, não podemos fazer outra coisa a não ser sustentar que a doutrina da criação temporal é um elemento do teísmo cristão. A relação entre tempo e eternidade é insondável para nós. Como teístas cristãos nós admitimos francamente este fato. Se alguém julga que não pode aceitar uma filosofia a menos que compreenda plenamente todos os seus conceitos, tal pessoa não pode se tornar um teísta cristão. Nossa única resposta a ela é que não podemos prescindir de Deus. Se não podemos manter duas posições simultaneamente, é preferível manter aquela que nos é imprescindível[1]. Mas nossos oponentes desprezam nossa inabilidade de prescindir de Deus. Eles pensam nisso como “uma prova de perdição”[2] intelectual. Para eles, nossa visão de criação temporal é a marca d’água de incompetência mental. Vejamos o que eles dizem.
  
O Deus do antiteísmo

Eles dizem que nosso Deus é tão inútil como (segundo o dito) o é um ministro numa pensão. É dito acerca de nosso Deus que Ele não possui “valor” algum para a “consciência religiosa”. Pelo contrário, Ele extrai uma grande quantidade de energia dos homens, que seria mais bem direcionada na melhoria das favelas. Eles substituem nosso Deus “inútil” por um deus útil. Para ser realmente útil, um deus não deve estar “afastado” do mundo. Ele deve ser um “Deus que suja suas mãos”. Ele não deve estar assentado, como um monarca oriental, mas deve ser “o Presidente da grande comunidade”. Desse modo, Ele é colocado no seu cargo mediante voto popular; Ele deve ser “a vontade comum idealizada” e “o Democrata”. Um deus dessa “espécie” é realmente útil porque ele fará tudo que puder para nos ajudar, bem como a si mesmo; ele é “o grande trabalhador”. Se nos sentimos desencorajados, ele está ao nosso lado, e se ele, por seu turno, também está desencorajado, talvez possa “extrair de nossa fidelidade força vital e um aumento de seu bem-estar”. Este deus é extremamente sociável. Ele não é aquele “monopolista rixoso que afirma:‘não terás outros deuses além de Mim’”, sobre o qual lemos nas Escrituras. O deus “útil” permitir-nos-á sermos “científicos”. Ele mesmo é realmente um cientista pioneiro – uma verdadeira “mente aberta”, sempre em busca de novos fatos. Sua juventude é constante renovada como a da águia[3]. “Atualmente, a deidade é sempre a qualidade empírica superior em relação à qualidade presentemente evoluída”. Ele é uma “variante” ao invés de uma constante. Ele é o produto de um Vir-a-ser ao invés da Fonte do Ser. Está intimamente unido ao fluxo universal das coisas. Portanto, Ele pode ser (e de fato é) o verdadeiro cientista.
  
O universo do antiteísmo

Para nós, Deus é a fonte do universo. Para nossos oponentes, o universo é a fonte de Deus. Para eles, o Espaço-tempo precede a Divindade; o Processo é anterior à Realidade. Deus "é, stricto sensu, uma criatura, e não um Criador”. Ou, novamente, talvez seja preferível dizer que Deus é um aspecto ao invés de um produto do processo do universo. Ele é “apenas a tendência ideal nas coisas”. Em cada caso, o universo é mais original do que Deus; Ele e os homens são cidadãos no universo que existe independentemente de ambos. Acerca da origem do universo, ninguém sabe nada efetivamente. Mas isso não importa. Acidentes acontecerão. Se você colocar seis macacos datilografando várias máquinas de escrever, eles eventualmente produzirão todos os livros do Museu Britânico. O racional, de alguma forma, procede do não-racional; o maior, de alguma maneira, procede do menor; a mais escassa possibilidade, de algum modo, produz a realidade.

O futuro deste universo é igualmente uma questão de sorte. Talvez haja propósito no mundo, mas caso haja, tal propósito é, de qualquer maneira, autogerado; Deus não o colocou ali. Em suma, devemos afirmar que o universo “adquiriu” Deus e anunciou publicamente a fusão empresarial. Enquanto a transição está sendo efetuada, os homens podem ainda assinar cheques no antigo banco e serão honrados pelo novo. Em breve, contudo, novas cédulas serão impressas e o comércio dos homens religiosos continuará exclusivamente com o universo. Então, por que não comprar algumas ações na nova “especulação da fé”? A religião não precisa do Deus antigo. Por enquanto, você pode pensar que sim – você se acostumou com o seu Deus antigo da mesma maneira que se acostumou com seu chapéu antigo. E, assim como você se habituará ao seu novo chapéu após usá-lo por um tempo, você se habituará ao seu novo Deus. Ele, de fato, tem uma aparência melhor do que o anterior – ele vai durar mais tempo. É hora de mudança.

Conclusão

Acaso fizemos uma caricatura da posição de nossos oponentes? Não, de modo nenhum. Há vários filósofos que acreditam num Deus tal como descrevemos. Não é necessário buscar em livros empoeirados, mas nas listas das obras mais populares para encontrar o tipo de deus e de universo que abordamos. Sendo assim, não é injustiça afirmar que a representação que se faz de Deus é o deus de grande parte da literatura atual. É verdade que há pensadores idealistas que não usariam a terminologia grosseira de seus irmãos mais pragmáticos. Contudo, se eles levassem a cabo as implicações de sua própria posição – até o amargo fim delas –, eles terminariam exatamente onde o Pragmatismo termina. Os Idealistas, assim como os Pragmatistas, admitem, logo no princípio de seu raciocínio, que o “universo” (ou, como eles constantemente se referem, a “realidade”) é um conceito fundamental mais extenso e mais fundamental do que o conceito de Deus. Podem não afirmar com estas palavras, mas o sentido é equivalente. Eles incluem Deus e o homem no seu termo “realidade”. Portanto, desde o princípio, a posição deles se configura como monista[4].

E se Deus está, desse modo, confinado ao universo, Ele deve se tornar um deus em evolução ou temporal, uma vez que o universo é temporal. Quando um se move, o outro também o faz, tal como as rodas da visão de Ezequiel. Podemos concluir que o Deus que esboçamos acima é a única alternativa para o Deus que servimos. Você deve servir um desses dois Deuses. Todo ser humano, na verdade, serve a um ou ao outro. A completude e a exclusividade desta alternativa deveriam ser apontadas em tempo oportuno e em tempo não oportuno. Josué afirmou que pouco importava quais deuses, dentre todos disponíveis, o povo serviria. Todos os ídolos, ele descreve, eram em última análise o mesmo, não importa quais eram seus nomes ou formas. Josué também não tentou ocultar do povo estes deuses. Ele apresentou todos os ídolos perante os olhos dos jovens e lhes disse para fazer uma escolha. Sua política era exibir todos estes ídolos a fim de que sua vacuidade pudesse vir à tona. Essa é uma política perigosa? Certamente, mas todas as outras são mais perigosas. Não se pode encontrar segurança tentando esconder de nossa juventude aquilo que está acontecendo no mundo. Eles descobrirão de qualquer modo. A única questão diz respeito ao modo como encontrarão, seja conosco e sob nossa orientação, seja por si mesmos. Portanto, devemos buscar, no desenvolvimento de uma filosofia verdadeiramente cristã, mostrar aos nossos jovens homens e mulheres que todas as posições, com exceção do teísmo, conduzem à total e final destruição de toda experiência humana. Se formos fiéis nisso, nesta nossa tarefa, podemos confiadamente esperar que o Espírito de Deus usar-nos-á como instrumentos para o estabelecimento de Seu reino nos corações dos homens.

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Notas:
[1] No original o autor realiza um jogo de palavras, baseado em uma expressão idiomática, praticamente intraduzível para o Português: “If we cannot have both cake and bread we would rather have bread than to have neither of the two”.
[2] Referência a Filipenses 1:28.
[3] Referência a Isaías 40:31.
[4] Monismo (do grego  μόνος, único, sozinho) é concepção filosófica segundo a qual a multiplicidade e variedade dos entes podem ser explicadas em termos de uma única realidade ou substância. Dito de outra forma, existe apenas uma substância da qual todos os entes são derivados. Dentre os pré-socráticos, Tales e Heráclito foram um dos principais adeptos dessa corrente e, séculos depois, Plotino, o principal Neoplatônico da Antiguidade, advogava a existência de um deus transcendental e inefável, denominado “O Uno”, a primeira hipóstase, de cuja natureza indivisível derivavam três outras hipóstases; são elas: o Nous (νους), o Pensamento, a Inteligência Divina; a Psyché (ψυχή), a Alma Cósmica; e, finalmente, o Cosmos (κόσμος), mundo em toda a sua ordem e harmonia.

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Fonte: Presuppositionalism 101Cornelius Van Til - Collection of Articles From 1920–1939. The Christian Theistic Theory of Reality - The Banner, 1931, Volume 66, Pages 1032ff
Tradução: Fabrício Moraes
Divulgação: Bereianos